Quando a McLaren lançou o MCL60 antes da pré-temporada da Fórmula 1, o time de Woking já exibia o abatimento pelo erro cometido. Andrea Stella, que havia recém-assumido como chefe, admitiu que a equipe "não estava feliz com o carro lançado", porque sabia que haviam errado algumas ideias básicas de design que fariam o pacote funcionar.
"Há algumas áreas nas quais percebemos com um certo atraso no desenvolvimento, direções fortes", disse à época. Essas direções vieram à tona em meio ao que se tornou um renascimento impressionante da equipe, que garantiu um pódio duplo no GP do Japão.
Antes da corrida em Suzuka, e logo após mais um grande pacote de atualização em Singapura, Stella nos deu um insight fascinante sobre os principais focos na mudança de design. Aqui está um resumo.
Asa dianteira com outwash
A McLaren se uniu a outras equipes na busca por um design de asa dianteira que entrega o máximo possível de efeito outwash (empurrar o fluxo de ar ao redor do pneu dianteiro para alterar a turbulência gerada e direcioná-lo para longe do carro.).
Isso foi obtido graças a um gerenciamento melhor das distâncias entre as aletas flap e a placa final, além da modelagem de cada aerofólio ao longo do vão.
Assim como explicado por Stella, os carros atuais não são capazes de produzir tanto outwash quanto a geração anterior, mas ainda é muito valioso o que é possível obter.
"Mesmo que essa geração de carros tenha reduzido o outwash em comparação à geração anterior de carros, todas as equipes estão tentando perseguir esse objetivo", disse. "Cada pouco que você ganha lhe dá melhores características, especialmente nas curvas de média e baixa velocidade".
Sidepods mais largos com 'escorregadores'
Trajetória de desenvolvimento do sidepod do MCL60
Photo by: Giorgio Piola
Apesar da McLaren já ter partido para a adoção do sidepod de downwash do estilo Red Bull em 2022, o time de Woking levou o negócio além neste ano. Há dois conceitos genéricos que surgiram nesta área do carro: tornar o sidepod o mais largo possível com um grande corte inferior e, posteriormente, maximizar o que ficou conhecido como "escorregador".
"É muito notável o quão mais largo ele é", disse. "Estamos tentando criar um caminho claro para energizar o fluxo de ar".
Há dois objetivos aqui: os sidepods largos e o corte inferior agressivo ajudam a interagir com mais downforce, enquanto os escorregadores ajudam a canalizar o ar para trabalhar melhor com o difusor.
"Não é algo tão simples assim de se fazer", disse Stella. Para viabilizar essa carenagem agressiva, a McLaren mudou os arranjos internos de resfriamento dos sidepods (incluindo radiador e tubulação) como parte da atualização apresentada no GP da Áustria.
Retorno da asa na borda do assoalho
Caminho do desenvolvimento do assoalho do MCL60
Photo by: Giorgio Piola
A chave para o sucesso com os carros de efeito solo está no design do assoalho, porque isso oferece muito downforce quando você acerta. É uma das áreas nas quais as equipes mantém mais segredos, e isso não surpreende, porque depende de muito trabalho.
"O trabalho detalhado na parte inferior do carro é um dos mais sofisticados do ponto de vista de engenharia, e um dos mais fascinantes que eu já vi".
Para melhorar a performance do assoalho a partir do GP de Singapura, McLaren reintroduziu a asa de borda, algo que havia testado originalmente em 2022 antes de abandonar o conceito.
"Isso meio que fecha um buraco porque, em 2022, nosso carro do shakedown tinha esse tipo de asa, que foi adaptada por alguns rivais. Depois percebemos que precisávamos ir com tudo por uma jornada que nos levou a removê-la por um tempo, quando tínhamos o 'skate' abaixo no carro".
"Aí ficou claro que alguns carros já haviam removido o skate no começo da temporada, e nós mudamos também. Essa área do carro entrega muita performance".
A mudança no regulamento feita pela FIA para 2023 exigiu uma mudança no pensamento das equipes em termos de como eles pensam vários aspectos do design do assoalho, sendo que um deles é a asa de borda e a solução do skate que haviam parcialmente desenvolvido em 2022.
Como consequência do novo regulamento, outros parâmetros precisaram ser reconsiderados também, incluindo a altura do carro, que parece ter criado uma troca entre o benefício do skate e do uso de uma asa alongada.
Melhorar a performance do assoalho também pode envolver mudanças em outras áreas também. A McLaren também fez modificações na cobertura da biqueira traseira e nas aletas do duto de freio no GP de Singapura, porque precisava injetar alguma energia do fluxo de ar nesta área.
"Tivemos algum trabalho aqui por causa do assoalho, com nosso flow-viz, não estava muito legal. Tivemos que mudar o perfil em algumas partes".
Eficiência da asa beam
Com os rivais da Red Bull percebendo que a alta eficiência do DRS do RB19 da Red Bull vinha do equilíbrio no arrasto entre a placa principal da asa traseira e da asa beam, a McLaren começou a seguir esse caminho também.
A partir do GP da Bélgica, a McLaren começou a cortar o arrasto da asa beam, com esperanças de que isso impulsionaria o efeito do DRS.
"Estamos trabalhando para criar os arranjos corretos da asa beam, para que possamos atingir o nível ideal de arrasto sem ter que reduzir demais o tamanho da asa superior. A asa beam aqui [no Japão] é relativamente descarregada em comparação a outras que tínhamos no começo do ano".
As mudanças de conceito na McLaren são fascinantes, e servem para dar esperança aos rivais de que é possível mudar também. Mas, talvez, o mais interessante, é que eles são prova de que, enquanto há preocupações sobre a geração atual de carros não oferecer muita janela para inovações, esse medo foi encerrado.
Questionado se havia ficado surpreso com a grande janela para ideias individuais, Stella disse: "Acho que todos ficaram surpresos pelo quanto de desenvolvimento é possível com essa geração de carros. Mas acredito que isso continuará".